Nepotismo e a contratação pública

Nepotismo e a contratação pública

11.07.2020

A contratação direta de pessoa jurídica que tenha em seu quadro societário cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade até o terceiro grau de gestor responsável pela contração, independentemente do valor do contrato, do benefício à contratada ou da existência de prejuízo aos cofres públicos, caracteriza nepotismo, justificando a aplicação da multa prevista no art. 58, inciso II, da Lei 8.443/92 e se mantem mesmo com eventual restituição dos valores recebidos pela pessoa jurídica.

Essa foi a orientação firmada pelo Plenário do Tribunal de Contas da União, no Acórdão n. 1409/2020, de relatoria do Ministro Raimundo Carreiro, no bojo do processo n. 006.569/2018-8.

Em síntese, o TCU avaliou a contratação direita, mediante inexigibilidade de licitação, de empresa contratada pelo Tribunal Regional do Trabalho da 16ª Região, cujo quadro societário era composto por sogra e esposa do Desembargador Presidente do TRT16, em violação às disposições da Lei 8.666/93 e da Resolução CNJ 7/2005 (com alterações introduzidas pela Resolução CNJ 229/2016).

Segundo art. 2º, incisos V e VI da Resolução CNJ 07/2005:

Art. 2° Constituem práticas de nepotismo, dentre outras:

[...] V - a contratação, em casos excepcionais de dispensa ou inexigibilidade de licitação, de pessoa jurídica da qual sejam sócios cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, dos respectivos membros ou juízes vinculados, ou servidor investido em cargo de direção e de assessoramento; (Redação dada pela Resolução nº 229, de 22.06.16)

[...] VI - a contratação, independentemente da modalidade de licitação, de pessoa jurídica que tenha em seu quadro societário cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade até o terceiro grau, inclusive, dos magistrados ocupantes de cargos de direção ou no exercício de funções administrativas, assim como de servidores ocupantes de cargos de direção, chefia e assessoramento vinculados direta ou indiretamente às unidades situadas na linha hierárquica da área encarregada da licitação. (Incluído pela Resolução nº 229, de 22.06.16)

A empresa foi contratada para ministrar curso específico de capacitação corporativa, sendo que sua contratação, segundo Ministro Revisor, derivou de "atuação dolosa de magistrado, agente público de alto escalão, na qualidade de presidente do TRT-MA", responsável por "propiciar a irregular contratação do instituto de educação recém aberto de sua esposa e de sua sogra, para prestar serviços ao tribunal que então presidia".

Assim, a maioria da Corte de Contas entendeu que se configurou grave lesão à moralidade administrativa, à impessoalidade e à probidade, bens jurídicos que a Resolução 7/2005 CNJ intentava proteger.

Ademais, o TCU também destacou que o recolhimento posterior dos valores indevidamente utilizados não tem o condão de sanar a irregularidade já concretizada. Isso porque, no caso de nepotismo, o principal bem jurídico tutelado não é o valor da contratação, mas os princípios constitucionais básicos da moralidade administrativa, da impessoalidade e da probidade administrativa, norteadores da atuação do administrador público probo.

Em relação à empresa contratada, o Ministro Relator havia reconhecido a ausência de fraude ou conduta doloso. Contudo, o Ministro Revisor - que foi acompanhado pela maioria do Plenário - entendeu que o fato de a contratada não ter auferido vantagem, em decorrência da restituição dos valores recebidos, não constitui óbice à sua punição, na medida em que o ganho pecuniário não é condição para a consumação da fraude à licitação. Nessa circunstância, tem-se que a fraude a que se refere à Lei Orgânica do TCU se aperfeiçoa com a conduta de frustrar deliberadamente a seleção da melhor proposta, independentemente da restituição dos valores.

As razões - tanto da empresa quanto do gestor - foram, portanto, rejeitadas pela maioria dos Ministros do TCU, sendo aplicada multa ao magistrado de R$ 40.000,00 e de R$ 3.246,00 à então diretora da Escola Judicial do TRT-16, na forma do art. 58, inciso II da Lei 8.443/92. E, quanto à empresa contratada, a maioria da Corte entendeu por aplicar-lhe a declaração de inidoneidade para participar de licitação perante a Administração Pública Federal, pelo prazo de 6 (seis) meses, com fundamento no art. 46 da Lei 8.443/92 c/c com o art. 271 do Regimento Interno do TCU.

Confira a íntegra do Acórdão no link abaixo.


 Por Ana Paula Mella Vicari

Av. Diário de Notícias, n. 400, sala 2101 | Torre Diamond
Bairro Cristal | Porto Alegre - RS | CEP 90810-080
*Disponível estacionamento do Barra Shopping Sul*
+55 51 3237-0870 | +55 51 3237-0583 | +55 51 98446-4675
Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.